The New Abnormal

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Ouça o novo disco:

Julian Casablancas e Honor Titus na NME

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Honor Titus (Cerebral Ballzy) entrevistou Julian Casablancas para o especial “Heroes” que veio na NME de março de 2014. Julian falou sobre Lou Reed e Bob Marley, e vocês podem conferir nossa tradução a seguir:

Julian Casablancas e Honor Titus não poderiam chegar ao local escolhido para essa cúpula de heróis NME – uma casa na suburbana Austin, Texas, no último dia do SXSW – de forma mais diferente se eles tentassem. Primeiro? Um veículo enorme disponibilizado pelo festival onde Julian tocou com sua nova banda, The Voidz.  O último? De braços abertos no teto do maltratado ônibus de turnê do Cerebral Ballzy, que parece uma torradeira com rodas, tendo sacrificado o seu lugar dentro da van para que eu pudesse me espremer entre os skates, bongs e os suados companheiros de banda.

A incongruência de pegar esta permanentemente chapada rua do punk de Manhattan para entrevistar o rei de Nova Iorque não é ignorada por ninguém, mas uma vez que os dois vocalistas se veem, sorrisos e abraços fraternais surgem. Julian assinou com Ballzy para a Cult Records, e eles se tornaram amigos rapidamente – cheque os elementos mais hardcore da nova música de The Voidz para ter uma prova disso.

Além do mais, apesar de ter feito nada menos que quatro shows no dia do nosso encontro, Honor passou a tarde trabalhando numa série de questões para seu novo chefe…

Honor Titus: Queria falar sobre Nova Iorque hoje. Vamos começar com Velvet Underground. Qual a primeira música deles que você ouviu e ficou como “Oh meu Deus”?

Julian Casablancas: Rock & Roll. Essa. E soava como uma daquelas bandas dos anos 1960 que estavam tentando fazer um hit. Eu senti que era uma música tipo sucesso de um único hit. Eu era jovem, cara! Algo daquela bobagem é incrível. Aquelas letras, ele era um gênio. Quero dizer, aquele maldito cara – você sabe que conheci ele, Lou Reed?

Honor: Isso é tão legal. Você conheceu Lou?

Julian: Sim. Estávamos em algum bar, não sei, só conversando um dia e alguém estava tipo “Oh, Lou Reed está autografando livros na Barnes & Noble”, então fomos lá. Isso foi quando eu tinha, talvez, 20 ou algo. Ele era tão legal. Fomos, mas claro que não tínhamos nada pra ele assinar, então pegamos um dos livros dele e só nos saímos bem. Ele era super apropriadamente estranho.

Honor: Era o que você queria, certo?

Julian: Sim. Ele disse algo estranho que ainda hoje assombra meus pesadelos. Ele disse “Filho de um Stroke” pra mim, porque eu pedi a ele que assinasse para os Strokes. Eu lembro que ele estava tipo, “Caneta?” mas nós não tínhamos caneta também, o que era estranho, então ele se virou para seu assistente e “Vou assinar com o sangue das minhas costas…”

Honor: Ele era super Nova Iorque, gay, judeu, tudo ao mesmo tempo. E tive uma história parecida com Richard Hell. Encontrei ele quatro meses atrás ou algo assim. Eu estava na loja de livros St. Mark fazendo nada em especial e olhando as revistas, e eu vi uma pilha de seu livro novo na mesa. E então eu me virei e ele estava derrubando a pilha de seus próprios livros! Eu estava tipo “Wow, Richard Hell!” Ele é realmente alto, o que me assustou, porque nas capas ele sempre está segurando um baixo e parece tão longo, ou tem uma garota num canto. Mas ele foi realmente legal.

Julian: Falando sobre livros, aquele livro de letras do Lou Reed [Pass Thru Fire] – cara! Eu nem sabia que suas letras eram tão boas.

Honor: Sim. E é estranho quantas alusões tem em suas letras, sabe? Peguei aquele livro, The Velvet Underground [de Michael Leigh], aquele baseado no nome. É um tipo de “sexo underground do estilo de vida cultural de Nova Iorque dos anos 1960”.

Julian: Eu não li, mas sim, Lou ficou bom por um tempo. Oh cara, cara – aqui tenho uma coisa. Eu sonhava com isso! Eu e Lou Reed tínhamos o mesmo agente, ok? Eu tinha esse sonho de que estaríamos juntos. Eu seria, tipo “Tenho que fazer uma música com ele!”. Estava na minha lista, sabe? No topo da lista de coisas que eu realmente queria fazer. Eu só pensei, “Se tivéssemos ele para uma música final no show…” e então tocar algo com uma vibe do velho Velvet Underground.

Honor: Isso teria sido insano.

Julian: Eu fiquei tão triste quando Lou morreu. Genuinamente triste. Ele é tudo – a razão pela qual eu comecei a gravadora, música… eu senti a injustiça, e quão incrível ele era. Mas ele não era realmente mainstream. Acho que ele pode ter usado muitas drogas, pra ser honesto. Mas também a coisa ao vivo – eu estava pensando que o que eu gostava dele era que ele não tentou fazer tudo soar igual. Houve uma separação. Eu também acho que é porque ele nem mesmo tinha noção do quanto foi amado. Quero dizer, ele devia ter alguma ideia, ele deve ter ouvido pessoas falando sobre Bob Dylan e ele, mas ele não era realmente mainstream. Mas pra mim, ele está no Monte Rushmore de caras incríveis.

Honor: Então, qual era seu clube favorito em Nova Iorque quando começou a tocar com os Strokes?

Julian: Oh, o primeiro show foi no Spiral. Cara, aquele lugar! Você nem precisava de uma demo pra tocar, você só tinha que ligar e pedir! Foi nosso primeiro show, mas acho que o Mercury Lounge foi o que estávamos mesmo procurando. Era um lugar pra música boa, onde as pessoas tocavam. Havia bastante gente mesmo. Quer dizer, aquele lugar, Mars Bar, era super rudimentar, eles passavam filmes de horror e essas coisas lá.

Honor: Eles fecharam, você sabia?

Julian: Sim, fecharam. É triste e ruim.

Honor: Cara, tenho algo bem satírico pra você: estão pra fechar Bowery Mission [um abrigo no meio de Manhattan] e transformá-lo num Hotel Ace!

Julian: Oh não, não, não, não!

Honor: É tão triste.

Julian: Cara, é por isso que eu acho que eu tive que ejetar.

Honor: Eu estou pensando o mesmo.

Julian: Oh, cara.

Honor: Manhattan se tornou valorizada num ponto sem volta, você acha?

Julian: Sim, muito. Está muito ruim agora.

Honor: Sim. Sabe, eu não quero refutar a ideia de Nova Iorque, não está acabado, sabe, mas ela é um brutamontes diferente agora. É aquela coisa sobre Nova Iorque. Você encontra pessoas que vivem no Central Park que pagam $250 por mês. Mas é aleatório. Acho que ainda existe, mas não é tão evidente quanto antes.

Julian: É uma pergunta difícil, a que você fez. É tão complicado. Acho que a coisa de fazer Nova Iorque tão atraente para turistas, tão corporativa, foi muito longe.

Honor: Você lê sobre a Nova Iorque do passado e em literaturas diferentes, e eu anseio por aquele tempo, é tão diferente.

Julian: Bem, é isso. Você sabe, com música eu notei que se você não toca em Nova Iorque e grava em Nova Iorque, isso definitivamente a afeta. As pessoas costumavam me perguntar sobre isso e eu ficava “Não sei”, o que era estúpido da minha parte, porque sim, se você está num lugar ensolarado e pega a guitarra… não é o mesmo. De todo jeito, devemos voltar para a tomada do mundo pelas corporações?! Está acontecendo!

Honor: Certo! O que queria falar com você agora era sobre literatura. Rumi: você gosta muito de Rumi, não gosta? Outro grande autor.

Julian: Cara, você me lembrou disso. Mas sim! Sabe, ele é legítimo, cara. Escrita realmente legítima. Nem sei se as pessoas sabem sobre ele, mas precisam saber.

Honor: Que escritores influenciaram você em Nova Iorque?

Julian: Oh, acho que sei o que você está falando, mas eu não sei. Quero dizer, Al [Ginsberg] e isso, tudo isso. Há uma longa linha de grandes escritores daqui.

Honor: Os Beats. Sim, cara.

Julian: Sempre fui fascinado por eles. Estava assistindo esses shows políticos, como Bill O’Reilly, entrevistando aquelas pessoas, e era tão interessante. Ginsberg era tão legal, porque ele era tão brilhante, mas tão subversivo e contracultura. Um cara muito esperto que fazia yoga indiana e coisas loucas. Ele era homossexual, e abraçou isso bem cedo na cena da contracultura, sabe. Ele era um gay gordo, barbudo, careca, e yogi.

Honor: Tem um documentário sobre Burroughs onde Ginsberg está, e Burroughs também. Eles tinham 65, 70 anos, e estava com esses namorados de 18 anos. É realmente estranho. É uma ideia super Nova Iorque, sabe – esses jovens vivendo com caras mais velhos.

Julian: Escravos sexuais!

Honor: Muito, certo. E eles mostram fotos deles como quando Burroughs e Ginsberg estavam juntos e jovens, e então os entrevistam agora, no presente, e eles são tão ‘foda-se’. É obscuro. Nova Iorque começa a ferrar com você… não se case com um autor velho ou você vai ficar louco!

Julian: Há uma longa linha de grandes autores aqui, é incrível.

Honor: Eu quero falar um pouco sobre composição. Tipo, eu sou um cara do baixo – quando eu ouço uma música, eu procuro pelo ritmo no baixo, e fico “é uma ótima música”. O que você procura de mais significante, que te deixa “Oh, meu Deus, eu amo isso”?

Julian: É uma boa pergunta. Há muitas coisas diferentes, acho. Sabe – bateria, baixo, tom, um híbrido desses três. E uma vibe. Acho que eu tenho um gosto eclético. Eu gosto de coisas estranhas, loucas. Intenção, é algo que eu procuro. Realmente, a verdade é que precisa ser poderoso. Ela me leva pra um lugar calmo? Eu ouço e fico “Porra”?

Honor: Acho que você definitivamente tem um olho para o detalhe e estilo que integra você e sua música. Você concorda? Acho que é tão legal.

Julian: Mmm, talvez. Me levou um tempo.

Honor: É bem uma coisa de Nova Iorque, trabalhar de um jeito abstrato, e eu posso totalmente ver como isso afeta o que você faz. É legal. E me afeta também.

Julian: Sim, mas acho que as coisas que você me mostra por email são as mais legais.

Honor: Deveria começar a fazer aquilo de novo, a troca de emails.

Julian: Oh, sim, por favor.

Honor (para NME): Estávamos trocando improvisos, é legal.

Julian: Sim. Eu lembro da maioria delas.

Honor: Você gostou bastante daquela música de Outcast, aquela banda dos anos 1960 [não André 3000 e Big Boi].

Julian: Sim, totalmente. E [a banda trash dos anos 1980] DRI. Era legal, porque foi a primeira coisa que você me recomendou. E você estava como “É isso!” e eu chequei e foi a coisa mais agressiva e insana de todas. Assumi que era tudo que você ouvia. Eles tinham uma coisa eclética, incrível. Como eu disse antes, uma música tem que ter um certo objetivo.

Honor: Eu concordo. Pra fechar, queria perguntar algo meio profundo sobre composição. Você pode me dizer um atributo que você acha que é supremo para fazer um trabalho substancial, que fique pra sempre?

Julian: Wow. Espera, eu preciso pensar nisso. Certo – eu diria que trabalhar mais que todo mundo. Ou ter uma mente de gênio ou de super robô e escrever, e então perceber uma forma mais esperta de entregar aquilo de um jeito que vai beneficiar 50 por cento de outros e 50 por cento de você, ou o que quer que seja o meio termo natural humano!

Honor: Está falando de esforço, então?

Julian: Estou. Mas talvez isso não seja felicidade. Talvez a melhor mente de todos os tempos esteja tipo “Eu realmente quero me matar”.

Honor: É definitivamente verdade.

Julian: Então talvez eu mudarei o que disse para isso: apenas vá devagar o bastante para aproveitar o passeio. Seria meu conselho pra você.

O herói do herói

Julian Casablancas sobre Bob Marley

“Vou escolher Bob Marley. Ele é o melhor! Você já viu Time Will Tell, aquele documentário antigo? Aquilo fez minha cabeça quando era criança. Eu tinha em VHS; acho que ainda tenho. Quero dizer, sem soar esquisito, mas nem considero ‘Jamming’, ‘Get Up, Stand Up’ e essas músicas famosas como suas melhores. Elas têm uma vibe muito boa, mas quando você diz Bob Marley para as pessoas, elas se confundem. Elas sabem seus sucessos e elas ficam “sim, o reggae”, mas é tão mais de que isso. Não é só a droga da música – é a emoção, o aspecto político, a integridade insana em todos os níveis. Como eu disse, ele é o melhor!”

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Tradução: Equipe TSBR