The New Abnormal

The New Abnormal

Ouça o novo disco:

Tradução – Entrevista de Julian Casablancas + The Voidz para GQ Magazine

Julian Casablancas está farto de tentar te salvar

Há uma década, como líder dos Strokes, ele era o messias de Nova York que deveria salvar o rock ‘n’ roll. Até que no fim das contas ele precisou de salvação. Agora ele saiu da cidade, (meio que) mudou de banda, e criou um novo (pesado!) som. Bem vindo de volta, Julian
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por Zach Baron
Por um momento, Julian estava perfeitamente ciente do motivo porque deixou Nova Iorque, sua casa durante a infância e o lugar onde sua banda, The Strokes, que antes era sinônimo de tudo de cru e sedutor sobre a cidade, primeiramente deu as caras. “Eu ando por Nova York agora e fico chateado,” ele tinha dito. Muitos bares de suco, basicamente. Poucos caras genuinamente cool como, bem – Julian Casablancas. Mas um dia depois ele parece se arrepender até mesmo dessa pequena frase dita. “Eu não diria que a razão é que eu ando por lá e odeie todo mundo que mora lá. Isso seria rude.” Com relutância ele me disse o nome da cidade ao norte para onde ele se mudou com sua mulher e filho. Agora ele parece reconsiderar essa informação também. “Você se importa se eu apenas disser que é ao ‘norte’, só por…”
Se você não odeia todo mundo em Nova York, o que fez você sair de lá?
“Hm, nós apenas encontramos um lugar legal que gostamos, que quisemos ir, e também… eu não sei… desculpa…”
É assim que ele fala. Como se estivesse constantemente pensando o que Julian Casablancas – quem quer que ele seja – diria, ou deveria dizer. Do outro lado da mesa, entre a escuridão do restaurante mexicano onde estamos sentados em algum lugar de Los Angeles, onde ele vem ensaiar com a sua nova banda, ele já parece estar sofrendo. Estamos aqui há onze minutos.
“De repente não estou fazendo isso muito bem, saindo dos trilhos, confuso entre o que é privado e o que não é…”
Ele parece ter um pouco mais de cabelo do lado direito da cabeça de que no esquerdo – é desigual e longo e angelical daquele modo esfarrapado familiar que está se tornando cada vez mais assustador enquanto ele envelhece. Ele decidiu não dizer muito sobre si mesmo – ele nunca realmente disse muito sobre si mesmo; ele balbucia coisas, é desajeitado, algumas vezes conflituoso – mas ele continua deslizando.
Ele é surpreendentemente bom em futebol.
“Você pratica esportes, Zach?” ele pergunta, com uma bola aos pés, o sol se pondo sobre um estúdio de estacionamento em Burbank, seus companheiros de banda circulando ao redor. Casablancas, 36 anos, tem um novo disco lançado em setembro com esses caras, The Voidz – cinco músicos de sessões que se tornaram verdadeiros amigos em que todos parecem variações de Animal dos Muppets – e eles estão treinando aqui fora no vale. Foi assim que nos encontramos pela primeira vez, formando essa configuração universal de irmãos preguiçosamente passando um objeto esférico para frente e para trás.
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O disco é intitulado “Tyranny”, e é meio sobre o que ele trata, Casablancas diz: companhias de óleo gananciosas e imprensa não-tão-livre-assim e depredação ambiental. Dinheiro. Saúde pública. Pesadelos. A lua. “Não é muito sedutor falar sobre essas coisas, especialmente em um lugar como a América, onde as coisas são, tipo, as melhores. Mas é como se estivéssemos dentro daquela bolha de Versalhes, sabe?”
“Tyranny” não soa como Strokes, nem como o primeiro disco super luminoso e quase autobiográfico de 2009, “Phrazes for the Young”; de fato, não soa como qualquer outra coisa de verdade, exceto talvez Black Flag em alguns pontos, e música circense da era digital de quinta dimensão em outros. Casablancas, contudo, confirma que “Tyranny” tem um forte potencial comercial, e quem sabe, talvez tenha mesmo – eu me vejo ouvindo uma das músicas, ‘Nintendo Blood’, repetidas vezes, toda cansaço e doce saudade, como algo vindo de um filme do John Hughes. Fazer as pessoas se sentirem desgastadas e sensuais ao mesmo tempo sempre foi o que Casablancas soube fazer melhor. Essa é uma qualidade que nenhum dos ruídos sinistros de palhaços ou música psicodélica da selva ou thrash metal – para citar alguns dos sons que você ouve em “Tyranny” – pode abafar.
Por que um cara que devia salvar o rock ‘n’ roll de uma geração inteira ao invés disso está em Los Angeles com baladas de 11 minutos de nomes como “Human Sadness” é uma pergunta diferente. Uma existencial, talvez: sobre o passado de Casablancas como uma pessoa que muitas, muitas pessoas uma vez já se importaram muito, mas também sobre seu futuro e se ele algum dia será esse cara novamente. Até mesmo se ele quer ser assim.
É quase difícil de lembrar agora quem os Strokes eram.  Talvez a melhor maneira de explicar é que eles muito brevemente fizeram um bocado de rock ‘n’ roll de qualidade que aparentemente tinha sumido deste planeta – agressivamente melódico, bêbado, impassível, qualidades perigosamente sem cortes – parecer possível novamente. E Casablancas foi a pessoa da banda sobre quem isso caiu mais pesadamente – o cara ungido para ressuscitar o gênero cujo nome o fez estremecer. “Quando penso em rock ‘n’ roll, eu penso, tipo… os anos 60… tipo, pompons…” Casablancas balbucia, se encolhendo. Ele diz que ser o que a NME uma vez chamou, em seu modo discreto de costume, “o jovem grupo de rock mais empolgante da Terra” não foi divertido naquele tempo, e viver o legado disso tem sido ainda pior, mentalmente e fisicamente, para todos envolvidos.
Basta dizer que ele está aqui fazendo o que faz porque isso o deixa feliz.
Ele chuta a bola em minha direção. Eu chuto de volta. Em seguida nós entramos em dois carros para comer comida apimentada e falar sobre filmes e vegetarianismo e ‘The Piña Colada Song” – qualquer coisa além de sua própria música ou Casablancas ele mesmo.
Ao fim da refeição, eu pago. Como resposta, Casablancas lidera os Voidz em uma espirituosa e profundamente embaraçosa serenata de ‘For He’s a Jolly Good Fellow’.
Um ano atrás, o seu pai morreu. Ele era complicado, John Casablancas. Fundador da Elite Model Management e talvez não o cara mais legal da perspectiva esposa-e-filho. Durante o almoço, pergunto a Julian sobre uma capa de 1988 da New York Magazine com o perfil de seu pai, que nos primeiros parágrafos conta uma história sobre sair de férias com a sua filha, a irmã por parte de pai de Julian, em Ibiza quando ela tinha 17. Um fotógrafo, vendo Cecile em um biquíni, pergunta se ele pode fotografá-la. O Casablancas mais velho se apressa, não para impedir, mas para combinar um preço: 2 mil dólares.
“Ela tinha um bonito corpinho,” John Casablancas diz, no sumário.
Eu pergunto a Julian se aquela é uma pessoa que ele reconhece.
“Acho que ele estava brincando,” Julian diz relutante. “Ele era um cara muito charmoso e engraçado, então tenho certeza que ele disse isso brincando se é que ele disse mesmo isso.”
No mesmo artigo, Julian aparece, ainda não nascido. John Casablancas avisa a sua então esposa, Jeanette Christjansen, que ele não é o tipo de homem que iria trocar fraldas. “‘Você vai ver, quando o bebê nascer, ele é bonito,’” lembra Christjansen dizendo. “E ele me disse: ‘Jeanette, nunca me peça isso.’”
“Isso… isso soa bem verdadeiro,” Julian diz, rindo nervosamente, depois que eu leio as palavras de sua mãe em voz alta.
Ele pausa.
Eu acho que isso é uma coisa de velho mundo. Eu não sei, cara. Eu luto com essas coisas. Ele morreu, tipo, um ano atrás, exatamente um ano atrás, então posso dizer nada além de coisas boas.”
John Casablancas não estava muito por perto quando Julian estava crescendo – infamemente, aos 41 anos ele teve um caso com uma modelo de 16 (um fato que não impediu seu filho, alguns anos depois, de lançar uma música chamada ‘Barely Legal’ no disco de estreia dos Strokes). Julian aprendeu mais sobre ser homem com o seu padrasto, o pintor Sam Adoquei, quem diria a ele coisas sobre arte e em última análise, deu-lhe uma ideia de como levar uma vida fazendo as coisas.
Não é particularmente um segredo bem guardado que Julian Casablancas escreveu os dois primeiros discos dos Strokes praticamente sozinho. Mesmo agora, falar sobre isso é desconfortável para ele. “É uma pegadinha, porque eu sempre gosto de criar essa ilusão vaga de coisa de banda assim,” ele diz. Eles eram realmente amigos, no começo. Eles ficavam bêbados e se beijavam de língua e brigavam com estranhos e depois bebiam mais. Casablancas escrevia as músicas e a banda as tocava.
Mas essas circunstâncias se tornaram insustentáveis: “Não era tão igual, mas era a ilusão de igual, então eu acho que isso fodeu com tudo.”
Eles saíram em uma improvável longa turnê depois de seu primeiro lançamento, “Is This It”, tocaram “360 shows seguidos,” e coletivamente viram um fantasma. “Uma banda é uma ótima maneira de destruir uma amizade, e uma turnê é uma ótima maneira de destruir uma banda,” Casablancas diz agora.
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Em 2005, ele se casou com Juliet Joslin, que era a gerente assistente dos Strokes naquela época. Ele também ficou sóbrio. Casablancas era um bêbado volátil; um perfil de 2003 da Rolling Stone retrata ele beijando platonicamente um repórter no pescoço sete vezes (“A noite é uma criança,” ele diz, piscando o olho, quando eu relembro essa história) e em seguida vagando pela noite. Ele bebeu desde que era adolescente, e quando tinha 26 anos, ele chegou a “um ponto intenso de saúde,” Casablancas me diz. “Ou eu parava ou não ia terminar bem.”
Também foi o ano – 2005 – que ele e o resto dos Strokes cambalearam dentro de um estúdio para gravar seu terceiro disco, “First Impressions of Earth”, um monumento inadvertido de auto-ódio e desprezo cansado. Casablancas nos dias de hoje é honesto, descontraído, boa companhia. Mas ele também é irremediavelmente, obliquamente ele mesmo. Há uma canção no “First Impressions”, ‘Ask Me Anything’, cujo refrão é simples: “eu não tenho nada a dizer”, repetido várias vezes, como uma franca declaração de esgotamento criativo registrada.
Como seus companheiros de banda reagiram quando você trouxe essa letra?
“Foi engraçado: Essa é uma daquelas histórias cafonas de compositores ‘Eu sonhei isso’, mas eu sonhei que era uma música do Scissor Sisters. E só tinha um refrão onde eles continuavam dizendo, ‘eu não tenho nada a dizer’, e foi tão hipnótico e estranho e me deixou maluco. Eu acordei achando que era uma música verdadeira. E então percebi: ‘Oh, espere, eu inventei isso no sonho, então eu posso fazer isso e não estarei plagiando.’”
Aqueles não eram seus sentimentos reais?
“Não. Eu apenas acho interessante, porque há algo tão vaidoso em estar em uma banda e ser o cantor. Então dizer ‘tenho nada a dizer’ pareceu um tipo de conceito revigorante e bacana.”
Na mesma música você diz, ‘Nós poderíamos arrastar isso / mas deixamos para outras bandas fazer’.
“Hmm, não. É mais sobre a duração da música.”
“Eu não sei com quantas, tipo, pessoas brancas fazendo brunch eu posso lidar em um sábado à tarde” é o que ele finalmente diz, como explicação sobre o porquê ele deixou Nova Iorque. Mas majoritariamente, ele não parece querer discutir isso, a decisão girou em torno de não criar seu filho lá.
“Acho que você cresce rápido demais na cidade,” Casablancas diz tristemente.
Ele fez as pazes com o modo turbulento, desequilibrado, e frequentemente bêbado com que ele mesmo surgiu em Nova Iorque, se você sentir que também é por isso que ele está buscando algo mais calmo com os Voidz. Ele tem uma nova, mesmo prática – se não particularmente romântica – forma de entender o que são os Strokes nos dias de hoje. “Eu acho que quando as bandas terminam, é outra forma de fraqueza. É algo como: ‘Mesmo? Vocês precisam de jatinhos diferentes para se dar bem?’ Eu posso entender que, tanto quanto isso é a minha vida, poderia ser um inferno para mim –”
Aqui ele pausa. “Eu não estou dizendo que seja assim agora.”
“Mas quando você pensa nas bandas que você realmente gosta e então eles se separaram, nunca é uma coisa positiva. Nunca é legal.”
Ele pausa novamente. “Nunca me senti tão dramático quanto a isso, eu acho.”
Pergunto se ele já ouviu algo de seus pais sobre o que eles pensavam dos Strokes e o que ele alcançou, aparentemente a despeito de, pelo menos, um deles.
“Acho que estão orgulhosos. Minha mãe, ela é engraçada: ela ouve os discos e canta junto e essas coisas,” Casablancas diz, sorrindo um pouco. “E muitos dos amigos do meu pai me disseram depois, que ele dizia não acreditar em todas as coisas que eu tinha feito.”
Fotos: Eric Ray Davidson
Tradução: Equipe TSBR
Fonte: gq.com